Pensando no que postar, tive a idéia de publicar entrevistas com pessoas “comuns” e de cara escolhi Wagner Hosokawa, amigo de longa data do movimento estudantil e do PT de Guarulhos, minha cidade natal. Eu sou filiada há sete anos, ele há dez. Como atualmente é difícil avaliar o governo e o próprio PT só com base na mídia, seja ela de oposição ou a favor, achei que seria interessante ouvir um militante, especialmente ligado à esquerda do partido. E a trajetória política de Wagner fez dele o “cara ideal” neste caso.
Eu o conheci pelos idos de 1998, acho que em alguma visita à minha escola, para incentivar a criação de um grêmio. O grêmio até saiu graças a mim e alguns amigos, mas em uma escola particular esse tipo de atividade não funciona da maneira ideal, não vinga. Como eu queria mais, comecei a visitar o Espaço Cultural Florestan Fernandes, mantido pelo então vereador do PT Edson Albertão – em 2005, Albertão trocou o partido pelo PSol. Lá, Wagner estava à frente de um grupo de esquerda da juventude petista, ao qual acabei me incorporando e acompanhando por cerca de dois anos.
O ingresso na faculdade em 2000 e a chegada da vida adulta me afastaram da militância política de corpo presente, mas não ao Wagner, atualmente com 27 anos. Ele foi membro do diretório do PT Municipal e da Executiva da Macro Região do PT. Também foi assessor político do mandato do ex-deputado federal Luis Eduardo Greenhalgh, mais conhecido como o “advogado do MST”. Hoje, é dirigente do Núcleo Lutadores do Povo, fundado recentemente com a ajuda de outros petistas.
Ou seja, Wagner sabe o que está se passando com o partido porque está dentro dele. É parte viva da base que o compõe e deixa claro que não está muito contente com seus rumos, nem do seu governo. Por quê? Leia a entrevista.
DVACC: Nas eleições internas do PT, em 2002, qual candidatura à presidência você apoiou, a de Lula ou Suplicy?
Wagner: Suplicy, por entender que o momento exigia mostrar ao campo majoritário – ou “ditadura da maioria”, como dizemos no PT – que não concordávamos com o arrefecimento das propostas defendidas pela esquerda para transformar o País.
DVACC: Você se arrepende do seu apoio? Por quê?
Wagner: Não, mas não foi fácil devido ao grande apelo interno do Lula – na própria esquerda defendíamos que era importante tê-lo na candidatura à presidência. Hoje, tenho certeza de que marcar aquela posição significou estar do lado da coerência histórica do PT.
DVACC: Como você avalia o primeiro mandato do presidente Lula e os primeiros meses do segundo? Está de acordo com as expectativas? Quais eram elas?
Wagner: No primeiro governo vivemos duas grandes crises políticas. A primeira foi a das reformas políticas, entre elas a da previdência, a criação das Parcerias Público-Privada (PPPs) e a tentativa de dar autonomia ao Banco Central, sem contar as realizadas na educação. Todas num caminho claro: privilegiar o capital em detrimento do interesse de um desenvolvimento social para o País. As PPPs, por exemplo, são uma maneira de privatizar o patrimônio que o Estado ainda nem ergueu, sendo que o poder da sociedade é maior sobre uma obra ou serviço gerida pelo setor público.
A segunda crise, a do mensalão, foi mais previsível. Ela não teve toda a força noticiada pela mídia, mas como a única coisa que as elites sabem fazer é pregar a “moral e os bons costumes”, e fazer tudo ao contrário debaixo dos lençóis, a Globo, a Veja e suas afiliadas, o PSDB e o PFL (atual Democratas), passaram a dizer: “tá (sic) vendo, eles (os petistas) também roubam”.
O segundo mandato foi mérito eleitoral único e exclusivo do Lula, que só se reelegeu devido a um novo populismo, inventado por ele mesmo e administrado pela “corte” lulista que compõe o primeiro escalão do governo e do PT. Confesso que foi uma vitória melancólica: o clima era do momento e não do processo ou seu futuro. Neste mandato, tinha a esperança de que o amargo do remédio experimentado no primeiro fosse sentido em menor dose, mas os sinais apontam para o pior: um processo de mais mudanças ruins para o povo.
DVACC: Sempre ficou claro que Lula não faria uma revolução no País. Mas era esperada a política de alianças em troca de governabilidade?
Wagner: Em 1994, sagrou-se vitoriosa a tese da “Revolução Democrática”, apresentada no 7° Encontro Nacional do PT e corroborada no 2° Congresso do partido, em 1999. Nós, da esquerda, nos conformamos, pois éramos todos petistas. Mas já estava em curso uma profunda mudança programática que, inclusive, flexibilizava as alianças, já em prática nas eleições municipais. Um panfleto da campanha do Zé Dirceu para governador, em 1994, chamou PMDB e PSDB de “farinha do mesmo saco”. Hoje, os “novos amigos” parecem ter mais importância do que a força popular.
DVACC: Qual seria a alternativa a essa política?
Wagner: Seria, em primeiro lugar, firmar alianças com as organizações populares, pois lá estão os militantes que vão às ruas em nome dos ideais. Segundo, firmar alianças com personalidades progressistas, democráticas e que tenham força na sociedade. Terceiro, conseguir alianças com partidos alinhados com um programa de governo popular.
DVACC: Você ainda acredita no Lula e companheiros do partido que fazem parte do governo?
Wagner: Nunca fui “lulista”, sempre fui petista. Não posso apoiar os “esquemas” expostos durante a crise do mensalão. A disputa interna no PT nunca foi justa e, vendo os privilégios, cifras de dinheiro astronômicas e favorecimentos, percebi porque a esquerda sempre foi derrotada. Eram muitos interesses em jogo, muitas vezes em detrimento do povo.
DVACC: Pensando no governo Lula até agora, qual foi sua maior decepção?
Wagner: Nenhum filiado tem o direito de dizer que foi enganado ou decepcionado, principalmente na condição de militante da esquerda socialista. Em 1998, o diretório do Rio de Janeiro, num encontro democrático e participativo, indicou candidatura própria, mas o grupo majoritário liderado pelo Zé Dirceu impôs o apoio ao Garotinho. Desde daquela época já denunciávamos esse corrupto. Nesse mesmo ano, nossa linha política de programa de governo foi derrotada e o Movimento Sem Terra foi praticamente vetado pela maioria dos candidatos do campo majoritário e da coordenação da campanha do Lula. O governo era previsível, só não esperava tão adaptado aos interesses do capital como agora.
DVACC: E do que você mais gostou?
Wagner: O reordenamento das funções do Estado, a transparência no funcionamento da máquina estatal e a presença de militantes muito capazes em diversas áreas estratégicas. Nunca foi tão claro diferenciar os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. E o Ministério da Justiça, com Márcio Thomaz Bastos, teve um papel importante na independência da polícia federal, reconhecido até pelo jurista Dalmo de Abreu Dallari. Cito, ainda, parte das políticas sociais e as secretarias especiais – das mulheres, racial e de diversidade sexual – , a ênfase na oposição à redução da maioridade penal e a mostra de que o patrimônio bem administrado, como no caso das empresas estatais, significa fortalecimento do interesse público. Mesmo que em matéria de política econômica o governo Lula tenha se rendido muito à lógica neoliberal, os chamados "desenvolvimentistas" têm tido espaço importante na formulação das políticas públicas estratégicas para o Estado, muito diferente do que acontecia nos governos tucanos-pefelistas.
DVACC: Como você classificaria a postura política do PT hoje: esquerda, centro ou direita? Por quê?
Wagner: De centro-esquerda. Vivemos uma situação parecida com a de alguns partidos sociais-democratas da Europa, como o Partido Trabalhista Inglês, que era de esquerda e com a eleição de Tony Blair foi infectado pelo “vírus” neoliberal. No entanto, ainda há vida pulsante no PT, militantes muito valorosos, construindo alternativas de esquerda e socialistas, apesar de no último congresso do partido apenas 4 das 16 teses estarem alinhadas com esse pensamento e com a visão estratégica da revolução.
DVACC: O que você espera do PT nos próximos anos?
Wagner: O futuro aponta para um partido que se adaptou à luta institucional, gostou de governar e seguirá nessa linha por um bom tempo. Nós, da esquerda, disputaremos a eleição com um programa socialista e de defesa do poder popular, pois acreditamos que o mandato parlamentar é um instrumento importante demais para ficar na mão de oportunistas, vendedores de ilusão e aventureiros. Nossa intenção é manter a força a serviço das lutas populares e pelos direitos de todos. Seguimos na construção de uma revolução socialista e batalhamos para todos perceberem que o mais importante é o projeto e não a sigla.
terça-feira, 24 de julho de 2007
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3 comentários:
Vejo com bons olhos a grande quantidade de militantes petistas com essa visão crítica com relação à tendência majoritária. No meu modo de ver o PT pena hoje porque não soube se adequar ao seu crescimento, tanto na estrutura quanto na manutenção da ideologia.
Por isso a debandada de quadros importantes para o PSOL. O que não dá para deixar de mencionar é a volta de 180 graus de gente como Zé Dirceu e todo o núcleo forte da Articulação. Talvez esteja aí o maior inimigo interno do PT.
E eu sou a próxima vítima? Meeeda! hahahahahahahaha
não comentar não significa não ler... :P
acontece que no passado não sabia o que dizer e nesse fiquei com preguiça de ir até o fim. sabe como sou pra essas coisas, né?
ei, eu leio sim seu blog. e comento também. atrasada, mas comento! :)
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